quarta-feira, 21 de setembro de 2011

Palestra de Dalai-Lama no Anhembi – 17/9/2011


No sábado passado, dia 17 de setembro, tive a oportunidade de sentar-me com milhares de pessoas no Anhembi para receber Sua Santidade, Dalai Lama, ovacionado por um público heterogêneo e pleno de respeito pelas palavras do líder religioso do Tibete.

Durante duas horas, Dalai Lama falou, ensinou, sorriu, brincou com o público, riu e tomado de seriedade fez perguntas à platéia sobre a desigualdade social, religiosidade e corrupção no Brasil. No final, encerrou dizendo que iria embora naquela noite, mas cada um de nós que ali ficaríamos, ainda teríamos os mesmos problemas, e que talvez, apenas talvez, se refletíssemos sobre o que foi conversado naquela manhã, pudéssemos encontrar uma saída. Humilde assim. Talvez. Apenas talvez. Mas a verdade é que se os seres humanos seguissem sua pregação de ética e tolerância, seguramente todo o mundo seria outro.

Dalai lama não procura converter ninguém. Ao contrário, disse que muitas são as religiões que transmitem ferramentas e ideias de paz no mundo. Completa, que mesmo o secularismo não é errado. Teísta ou não, praticante ou não de uma religião, existem conceitos universais que devem ser praticados por todos. Que existem diferenças entre as pessoas, mas que fundamentalmente somos todos iguais. Para ele, religião é uma questão de foro íntimo e deve ser respeitada, assim como a falta de uma. Os valores do homem encontram-se na ética e na sua moral, e não nas suas diferenças, sendo a religião apenas uma delas.

Segundo ele, hoje existem grupos de estudiosos na Ásia, Europa e Canadá, pesquisando a melhor maneira de incluir os ensinamentos de ética e boa conduta desde os primeiros anos escolares.  Enquanto isso não se concretiza, afirma que a família é responsável por esses ensinamentos, através de incansável repetição de bons exemplos. Inúmeras vezes ele se referiu à educação como a melhor forma de evolução moral e social. Disse, quando perguntado no final a respeito do Mal, que o Mal é a ignorância, e aconselhou que as pessoas buscassem respostas nos livros antes de confiar nos conselhos de outras pessoas. Que os livros trazem ensinamentos milenares de grandes personalidades da humanidade, assim como, obviamente, alertou contra o risco de a espiritualidade ter se tornado um comércio lucrativo. Sugeriu que antes de escolher uma religião, façamos como quem compra uma maçã na quitanda: investiguemos o máximo possível para escolher a melhor. Nesse caso, a investigação seria através de grandes escritos deixados no mundo. Afirmou que existem várias realidades, por isso é importante procurar conhecer a todas. Contou que esse ensinamento é de um líder religioso do século XI, e buscando respostas nas fontes evitaríamos adotar a resposta errônea de outra pessoa. Que cada um tem uma religião – ou nenhuma – que se adapte melhor às suas características mentais e emocionais.

No início, Dalai Lama falou sobre desmilitarização e paz mundial, passo a passo. Dos continentes e países chegou ao ser humano, dizendo que o primeiro passo é o desarmamento de cada um de nós.Que nossas armas – ódio,raiva, medo, insegurança, ambição – são o que levam o mundo ao caos. A felicidade, segundo ele, está na sabedoria de limitar a ambição dentro dos parâmetros da possibilidade, do que é real e passível de conquista, evitando assim a frustração. Disse ainda, que frustrados, temos medo, somos inseguros e portanto infelizes. Que a paz interior está exatamente na satisfação de viver plenamente nossas vidas, alcançando o que nos procuramos. E para tanto, não adianta ambicionar algo muito além ou que nos traga intempéries emocionais.

No final da palestra, Sua Santidade explicou a diferença entre tolerância e permissividade. Disse que ser tolerante significa olhar para seu inimigo com compaixão, sem submeter-se ao seu erro. Pois permitir que o inimigo continue errando sem opor-se a ele, é um erro grave. Por outro lado, toda oposição deve ser pacífica (como dizia Gandhi), e o foco deve ser o pecado e não o pecador (como ensinou Cristo). Repetiu que o inimigo é nosso mestre e devíamos agradecê-lo, porque na vida, a maior virtude de um homem (segundo o budismo) é a paciência. E paciência tem que ser exercitada. Os budistas passam anos exercitando-a. Concluiu que nossos inimigos são apenas mestres que aparecem em nossa vida, provocando um momento de desequilíbrio em nossa existência e nos dando a oportunidade de praticar os conceitos de tolerância e paciência.

Saímos do Anhembi com muito em que pensar. Ali estava um homem que havia falado com renomados cientistas e empresários poderosos no dia anterior, com a mesma tranquilidade que uma criança quando brinca no jardim. O que mais me impressionou foi conhecer uma pessoa feliz. O seu sorriso e bom humor constantes são sua marca registrada. Tenho certeza que ele se desmilitarizou há muito tempo. Para ele, a corrupção é um câncer na humanidade e a educação é mais importante que a religião. Pois sem ética, nunca atingiremos uma universalidade, um povo mundial sem fronteiras e desigualdades. Uma raça humana unida. Quem pode discordar dele?